Estudo diz que alteração genética dificulta o emagrecimento de adolescentes
A obesidade é uma patologia crônica, que deve ser controlada a vida toda, caracterizada pelo acúmulo de gordura corporal e de caráter multifatorial, tendo a influência de diversos fatores.
Dados recentes da ONU (Organização das Nações Unidas) mostram que mais da metade da população brasileira apresenta excesso de peso, sendo que a obesidade já atinge 20% dos adultos. Além disso, 8,9% da população adulta brasileira têm diabetes, 25,7% hipertensão arterial e 12,5% alteração no colesterol.
A Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) conta um grupo de estudos focado em obesidade (GEO). Há um modelo de intervenção em que os voluntários com obesidade passam por um ano de terapia com uma equipe multidisciplinar, realizando exercícios três vezes por semana, recebendo orientações dietéticas e atendimento de médicos e fisioterapêuticos.
Sempre os resultados são muito promissores, tanto que esse protocolo é referência em diversos estudos. Porém, alguns voluntários apresentavam pouca ou nenhuma alteração no peso mesmo realizando a mesma intervenção dos outros. Por que isso acontecia?
"Ficava muito intrigada com o fato de alguns adolescentes passarem por um processo de emagrecimento com o protocolo oferecido pelo GEO e outros não apresentarem resultados significativos. Observava que não era nem falta de empenho do voluntário, muito menos equívoco na metodologia. Notei que havia algum problema que poderia desfavorecer os resultados desses participantes e tentei, dessa forma, buscar as respostas na genética", disse a pesquisadora principal do estudo, Flávia Corgosinho.
Pensando nisso, o estudo de doutorado publicado no final de 2017 na Neuropeptides, por Corgosinho, que foi orientada por Ana Dâmaso, realizado com 76 adolescentes –entre 15 e 19 anos — com obesidade — peso entre 101 e 120 quilos –, avaliou os adolescentes obesos submetidos à terapia do GEO antes e após um ano de intervenção. Os resultados foram promissores, mostrando que um polimorfismo no gene receptor da leptina (sinalizador da saciedade) altera a regulação neuroendócrina e o balanço energético, alteração genética que dificulta o processo de emagrecimento.
A pesquisadora acredita que esses adolescentes têm uma maior dificuldade para emagrecer, pois têm uma quantidade de neuropeptídeos orexígenos (que são os sinalizadores da fome) aumentados, levando a uma dificuldade de reduzir o estado de hiperleptinemia –quando há concentrações de leptina (hormônio responsável pela saciedade) acima do normal –, levando a uma resistência a esse hormônio. Os adolescentes que tinham essa alteração genética passavam por uma dificuldade de normalizar esse hormônio da saciedade e fazer com que ele funcionasse de forma efetiva.
Os resultados chamam bastante atenção, uma vez que os adolescentes que tinham essa alteração genética já começavam o tratamento com o perfil de neuropeptídeos orexígenos mais elevados do que quem não tinha a alteração genética. Esse fator leva a entender que esses voluntários já iniciavam a terapia "desfavorecidos" em relação aos outros.
Corgosinho reforça que "ainda não podemos usar esses resultados como regra para todo restante da população, pois é uma amostra de adolescentes — limitando o resultado da pesquisa a uma faixa etária específica — com obesidade. Entende-se que para adolescentes com o perfil normal talvez não seja aplicável. Além do mais, o cálculo amostral, ou seja, o número de participantes do estudo refere-se a estatística da população na cidade de São Paulo. Por isso, é difícil levar esses resultados para toda a população de adolescentes do mundo. Porém, de fato, é uma amostra representativa da população de obesos na capital paulista. Outro fator que deve ser levado em consideração é que existem vários genes relacionados à obesidade e ao emagrecimento e nesse estudo foi analisado apenas um gene e uma alteração genética desse gene, pois sabe-se que existem outros polimorfismos nesse mesmo gene que podem estar associados a esse processo de emagrecimento".
Conclui-se que novas vertentes vão se abrindo. A obesidade mais uma vez mostra o seu caráter multifatorial. Os dados são promissores para estudarmos ainda mais sobre esse tema, ou seja, a relação da obesidade com os fatores genéticos, que pode favorecer, ou não, o processo de emagrecimento. Além do mais, os adolescentes obesos que tinham alteração genética tinham todo um perfil de hormônios vinculados à regulação da fome e saciedade que prejudicam a sinalização e dificultam o processo de emagrecimento.
A autora deixa algumas dicas para a população que sofre de obesidade:
- A obesidade precisa ser enxergada como uma doença e deve ser tratada como tal;
- É necessário um trabalho com uma equipe integrada e multiprofissional (nutricionista, educador físico, endocrinologista, psicólogo, fisioterapeuta etc.) para que o tratamento seja efetivo;
- Podem existir fatores genéticos que dificultam o processo de emagrecimento, mas isso não quer dizer que o emagrecimento não vá acontecer, e sim, que pode ser um pouco mais difícil. Vale pontuar que o estudo notou que, mesmo os adolescentes que tinham alterações genéticas, conseguiram emagrecer, apesar de emagrecer menos. Além do mais, eles tiveram diversos benefícios na saúde, como redução de gordura corporal, aumento de massa magra e redução de gordura visceral. Isso reforça que a pessoa com alteração genética pode ter mais dificuldade, mas continuam tendo resultados.
A carga genética tem sim um papel importante, porém ela não é um fator determinante. Não é a carga genética que vai determinar se você irá emagrecer ou não, ela só ajudará ou dificultará o processo de emagrecimento. Vale lembrar que há testes de obesidade presentes no mercado, mas hoje ainda não temos um que avalie essa alteração genética em específico.