Topo

Paola Machado

Musculação atrapalha crescimento do adolescente? Quando começar a treinar?

Paola Machado

18/09/2018 04h00

Já contei que comecei a treinar com 11 anos e só desfrutei de benefícios do exercício físico –mas comecei praticando lutas e corrida e entrei na musculação apenas aos 17 anos. Esse dias dias, me de deparei com uma questão inusitada: meu filho de 9 anos pediu para fazer musculação. Sim, 9 anos. Ele joga basquete e quer fortalecer seus pequeninos músculos para ter melhor desempenho.

Nunca imaginei que teria de lidar com isso tão cedo, apesar de meus dois filhos me verem treinando sempre, o que os incentiva –a caçula, de 6 anos, já faz burpee, agachamento e corre a 7 km/h na esteira, se deixar, por mais de 10 minutos.

A nova geração está mais engajada e dedicada a ter hábitos saudáveis. Por isso, não é raro ver a garotada com 12, 13 anos querendo fazer musculação. É algo que me deixa muito feliz. Mas é comum os pais terem dúvidas sobre o assunto: "É saudável?"; "Já ouvi que atrapalha o crescimento, é verdade?".

Já adianto que, com os devidos cuidados, o treino de força não prejudica o desenvolvimento ou a saúde dos adolescentes, mas a seguir você vai entender melhor tudo isso.

Que cuidados tomar no treino?

De acordo com a National Strength and Conditioning Association (NSCA), ao contrário do que muita  gente pensa, a musculação não traz prejuízos para a saúde de crianças e adolescentes quando:

  • Não há nenhum problema impeditivo para a prática — sempre passar com o médico responsável para tal liberação;
  • A atividade é supervisionada por profissionais capacitados, que devem orientar cuidadosamente e corrigir a execução dos exercícios;
  • O ambiente de treino é monitorado e seguro. Além do mais os equipamentos devem ser apropriados para o tamanho e idade da criança/adolescente;
  • O aluno tem maturidade física e emocional para entender os princípios e regras do treinamento –a criança deve estar mentalmente pronta para obedecer as instruções do professor e seu organismo preparado para suportar o "estresse" estabelecido por um programa de treinamento.
  • A criança/adolescente se sente confortável com o programa de treinamento, está feliz com a prática, segura e tem apoio da família.
  • A alimentação e hidratação são supervisionadas e orientadas por um profissional.

Qual a idade ideal para começar a fazer musculação?

O treinamento de força entre os mais novos tornou-se mais comum nos últimos 15 anos, quando pais, treinadores e profissionais de medicina esportiva notaram os benefícios em crianças –lembre-se que estou falando aqui da prática com benefícios de fortalecimento, saúde, bem-estar e não estéticos.

Apesar de não haver restrições para quem está abaixo dessa idade, o recomendado é começar a fazer musculação a partir dos 12 anos –obviamente isso pode mudar de jovem para jovem e é importante uma avaliação antes do início do treino. O indicado é começar o treino bem leve, com pouca carga e exercícios mais simples. A atividade deve durar, no máximo, 40 minutos e ser feita até três vezes por semana.

Reforço: a criança precisa estar pronta para participar desse treinamento, com devido encaminhamento médico e supervisão de um educador físico.

Veja na tabela abaixo as recomendações por faixa etária –inclusivo para menores de 12 anos, pois, como falei, não há restrições:

Se a criança está acima da primeira faixa etária (7 anos ou menos) mas nunca treino antes, deve começar pelas recomendações das idades anteriores, o que vai permitir a tolerância ao exercício e boa progressão.

Benefícios da musculação na infância e adolescência

Os benefícios do treino de força nessa faixa etária podem ir muito além do ganho de músculos, com melhoras de outros sistemas fisiológicos e também psicossociais e emocionais, como:

    • Correção da postura;
    • Melhora da flexibilidade, condicionamento e desempenho físico;
    • Aumento da densidade mineral óssea, prevenindo doenças ósseas;
    • Aumento da força muscular e resistência muscular local;
    • Prevenção de lesões em outros esporte;
    • Desenvolvimento de hábitos de exercício duradouros, afastando o pequeno do sedentarismo no futuro;
    • Aumento da concentração;
    • Chance de socialização;
    • Melhora da autoestima, bem-estar psicológico e redução de quadros depressivos;
    • Melhor resposta da pressão arterial ao estresse;
    • Melhora do padrão da composição corporal (redução do percentual de gordura e aumento da massa magra);

Mas a musculação não atrapalha mesmo o crescimento de adolescentes?

Se o bom-senso for respeitado e todas as recomendações seguidas, qualquer atividade física, incluindo o treinamento de força, influencia positivamente no processo de crescimento em qualquer fase de desenvolvimento. Portanto, a musculação não vai afetar na altura máxima natural que a criança/adolescente irá atingir.

De acordo com uma revisão científica realizada pela Revista Brasileira de Prescrição e Fisiologia do Exercício, não há nenhum estudo que confirme qualquer correlação entre o treinamento de força e lesões ósseas ou qualquer tipo de complicação no crescimento de crianças e adolescentes. Muito pelo contrário. O estudo de Sousa, Barreto (2003) avaliou 12 pré-adolescentes com idade entre 10 e 13 anos que fizeram musculação duas vezes por semana durante três meses. Resultado: os jovens ganharam 0,29 cm a mais de altura do que quem não treinou. Isso deixa bem claro que o treinamento de força atua de forma benéfica no crescimento.

Com base nas evidências científicas, espero ter esclarecido que a musculação contribui favoravelmente para a promoção da saúde e qualidade de vida de crianças e adolescentes.

Acha que faltou eu esclarecer o que decidi fazer com meu filho? Bom, na última vez que fomos à academia ele já fez supino, desenvolvimento de ombros, barra fixa –tudo sem peso, pois ele ainda está aprendendo os movimentos.

REFERÊNCIAS:
– Zatsiorsky, V. M.; et al. Ciência e prática do treinamento de força. Editora Phorte; segunda edição; 2008.
– ACSM (American College of Sports Medicine). Diretrizes do ACMS para os Testes de Esforço e sua Prescrição. Guanabara. 2010.
– da Silva Filho, J. N.; et al. Efeitos do exercício de força sobre o desenvolvimento ósseo em crianças e adolescentes: uma revisão sistemática. Revista Brasileira de Prescrição e Fisiologia do Exercício. São Paulo. v.9. n.51. p.40-47. Jan./Fev. 2015.
– Haapasalo, H.; e Colaboradores. Effect of Long-Term Unilateral Activity on Bone Mineral Density of Female Junior Tennis Players. Journal Of Bone And Mineral Research. Vol. 13. Num. 2. p.310-319. 1998.
– Kontulainem, S.A.; e Colaboradores. Does previous participation in high-impact training result in residual bone gain in growing girls? One-year follow-up of a 9-month jumping intervention. Int J Sports Med. Vol. 23. Núm. 8. p.575-581. 2002.
– Fuchs, R.K.; Snow, C.M. Gains in hip bone mass from high-impact training are maintained: a randomized controlled trial in children. J Pediatr. Vol. 141. Núm. 3. p.357-362. 2002.
– Sousa, C.A.; Barrerto, S.J. A influência da musculação no crescimento, tônus, força e obesidade de meninos entre 10 a 13 anos da escola de Barão do Rio Branco de Blumenau/SC. Revista Kinesis. Núm, 28. p.21- 29. 2003.
– Mackelvie, K.J.; e Colaboradores. A school- based exercise intervention increases bone mineral buildup in early pubertal girls. Med Sci Sports Exerc. Vol. 45. Núm. 1. p.36-42. 2013.
– Yu, C.C.; e Colaboradores. Effects of strength training on body composition and bone mineral content in children who are obese. J Strength Cond Res. Vol. 19. Núm. 3. p.667-672. 2005.
– Gunter, K.; e Colaboradores. Impact Exercise Increases BMC During Growth: An 8- Year Longitudinal Study. Journal of Bone and Mineral Research. Vol. 23. Núm. 7. p.986-993, 2008.
– Mackelvie, K.J.; e Colaboradores. A school- based exercise intervention increases bone mineral buildup in early pubertal girls. Med Sci Sports Exerc. Vol. 45. Núm. 1. p.36-42. 2013.
– Anliker, E.; e colaboradores. Effects of jumping exercise on maximum ground reaction force and bone in 8- to 12-year-old boys and girls: a 9-month randomized controlled trial. J Musculoskelet Neuronal Interact. Vol. 12. Núm. 2. p.56-67. 2012.

Sobre a autora

Paola Machado é fisiologista do exercício, formada em educação física modalidade em saúde pela UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), mestre em ciências da saúde (foco em fisiologia do exercício e imunologia) e doutoranda em nutrição pela UNIFESP. É autora do Livro Kilorias - Faça do #projetoverão seu estilo de vida (Editora Benvirá). Atualmente, atua como pesquisadora, desenvolvendo trabalhos científicos sobre obesidade, e tem um canal de desafios (30 Dias com Paola Machado) onde testa a teoria na prática. Também é fundadora do aplicativo aplicativo 12 semanas. CREF: 080213-G | SP

Sobre a coluna

Aqui eu compartilharei conteúdo sobre exercício e alimentação para ajudar você a encontrar o caminho para um estilo de vida mais saudável. Os textos são cientificamente embasados e selecionados da melhor forma possível, sempre para auxiliar no seu bem-estar. Mas, lembre-se: a informação profissional é só o primeiro passo da sua nova jornada. O restante do percurso depende 100% de você e da sua motivação para alcançar seu objetivo.