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Paola Machado

Frutose faz mal? Devo reduzir o consumo de frutas para emagrecer?

Paola Machado

13/05/2019 04h00

Crédito: iStock

Você sabe o que é a frutose? Ela é uma molécula orgânica composta por carbono, hidrogênio e oxigênio, classificada como um monossacarídeo (açúcar) e está abundantemente presente nas frutas –daí a pergunta que intriga a todos: quem quer emagrecer pode comer frutas?

Este nutriente pode ser encontrado também em adoçantes, mel, xarope de milho, néctar de agave, suco concentrado de frutas e, em menor quantidade, em alguns outros alimentos como feijões e ervilha; fique atento à leitura de rótulos e ingredientes, pois está amplamente distribuída nos alimentos industrializados.

Sua principal função é fornecer energia, por isto participa da principal via metabólica com esta finalidade, a glicólise; a frutose da dieta existe principalmente sob três formas: monossacarídeo, sacarose que é um dissacarídeo de frutose e glicose, e na forma de cadeias como frutanos. Durante a sua metabolização, o fígado a armazena na forma de glicogênio e a devolve ao sangue quando as concentrações de glicose se tornam baixas –este processo é dinâmico e autorregulado.

Nas últimas décadas, muitas pesquisas têm  evidenciado o aumento no consumo de produtos industrializados, e, associado a isso está o aumento no consumo de frutose (o ponto de partida foi nos EUA), especialmente na forma de sucos de frutas, bebidas com frutas e xarope de milho com alto teor de frutose em refrigerantes e confeitos.

A razão principal pela qual a frutose é usada comercialmente em bebidas e frutas industrializadas, além de seu baixo custo, é o seu sabor agradavelmente adocicado, pois é considerado o composto mais doce entre os carboidratos que ocorrem naturalmente (tem 1,7 vezes mais doçura do que a sacarose). O doce da frutose é percebido mais cedo que outros açúcares, sem contar o fato de que ela ainda pode realçar outros sabores no sistema gustativo, tornando estes alimentos altamente palatáveis.

Alguns estudos demonstraram que o consumo da sacarose está diretamente associado ao ganho de peso; em pesquisa feita por Sievenpiper e colaboradores (2012), com 637 participantes consumidores de dietas com características controladas, e duração máxima de 12 semanas, observou-se que no grupo com dieta sem excesso de calorias, porém com maior quantidade de frutose, foi identificado maior ganho de peso; nas dietas hipercalóricas, esta mesma condição relacionada ao peso corporal se confirmou. Temos algumas suposições e estudos clínicos tentando justificar e até explicar esta situação, e uma das sugestões mais convincentes relaciona-se ao fato de que, quanto maior é a quantidade de frutose consumida, maior é a quantidade de calorias ingeridas ao longo do dia, o que pode ser explicado quando olhamos um pouco mais sobre a fisiologia do corpo humano, buscando compreender o mecanismo de ação que acontece lá no sistema nervoso central, especificamente no hipotálamo. O hipotálamo é uma área de grande importância no controle do apetite, tanto que tem como suas estruturas os centros da "fome" e da "saciedade".

Acredita-se que o elevado consumo da frutose possa promover maior atividade de substâncias com a capacidade de aumentar a fome (orexígenas), como o peptídeo da produção do transcrito (AgRp) e neuropeptídeo Y (NPY) no sistema nervoso central, e que na contramão destas evidências, quando a frutose é consumida em menor quantidade (tendo como substituto na pesquisa a glicose), este mecanismo comporta-se de forma diferente, inibindo a fome (ação anorexígena) e, consequentemente, o consumo alimentar, especificamente pela atuação do pró-opiomelanocortina (POMC) e do transcrito regulado por anfetamina e cocaina (CART).

Porém, estes estudos avaliaram o efeito da frutose de forma isolada, e ao pensarmos em seus efeitos na vida prática, algumas considerações precisam ser ponderadas:

  1. Alimentos industrializados têm maiores concentrações de frutose do que um alimento in natura, como uma fruta.
  2. Os nutrientes não estão presentes nos alimentos de forma isolada, ou seja, quando comemos uma maçã, manga ou melancia, não estamos ingerindo apenas "frutose", e sim um alimento que além deste monossacarídeo contém fibras alimentares, vitaminas, minerais e isto certamente mudará a sua assimilação em nosso organismo. Parte desta mudança está relacionada à quantidade de fibra presente, que tem como função retardar a velocidade com que absorvemos os açúcares dietéticos tendo, portanto, um efeito positivo. Então, aqui respondo, não é preciso deixar de comer frutas para emagrecer.
  3. Outra questão a considerar é a associação ou forma de preparo dos alimentos, considerando que a fruta na forma de suco (mesmo que natural) será absorvida de mais rapidamente e terá um potencial maior para elevar a nossa taxa de açúcar no sangue; já se consumirmos estes alimentos de forma integra, com casca ou ainda associadas com farelos, aveia e cereais em geral, esta condição mudará de forma importante, ou seja, teremos um retardo na velocidade de absorção dos nutrientes e do aumento da glicemia.

O que estou querendo dizer é que não podemos apenas considerar o efeito isolado de um nutriente no corpo humano, e sim a forma com que ele interage com os demais e também com as nossas características individuais.

*Colaboração da nutricionista comportamental Dra. Samantha Rhein

Referências:
– Sienenpiper, John L e colaboradores. Effect of Fructose on Body Weight in Controlled Feeding Trials. Annals of Internal Medicine. 156 (4), 2012.
– Lane MD, Cha SH. Effect of glucose and fructose on food intake via malonyl-CoA signaling in the brain. Biochem Biophys Res Commun. 2009 Apr 24;382(1):1-5. doi: 10.1016/j.bbrc.2009.02.145. Epub 2009 Mar 3.
– Lehninger, Nelson e Cox. Principios de Bioquímica. Ed Sarvier, 1995.
– Cozzolino, SMF. Biodisponibilidade de Nutrientes. Ed Manole, 2007.

Sobre a autora

Paola Machado é fisiologista do exercício, formada em educação física modalidade em saúde pela UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), mestre em ciências da saúde (foco em fisiologia do exercício e imunologia) e doutoranda em nutrição pela UNIFESP. É autora do Livro Kilorias - Faça do #projetoverão seu estilo de vida (Editora Benvirá). Atualmente, atua como pesquisadora, desenvolvendo trabalhos científicos sobre obesidade, e tem um canal de desafios (30 Dias com Paola Machado) onde testa a teoria na prática. Também é fundadora do aplicativo aplicativo 12 semanas. CREF: 080213-G | SP

Sobre a coluna

Aqui eu compartilharei conteúdo sobre exercício e alimentação para ajudar você a encontrar o caminho para um estilo de vida mais saudável. Os textos são cientificamente embasados e selecionados da melhor forma possível, sempre para auxiliar no seu bem-estar. Mas, lembre-se: a informação profissional é só o primeiro passo da sua nova jornada. O restante do percurso depende 100% de você e da sua motivação para alcançar seu objetivo.