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Paola Machado

Como o sono impacta em seu desempenho e leva a lesões no treino

Paola Machado

17/07/2019 04h00

Crédito: iStock

Dormir é uma parte importante de nossa rotina diária. Alguém tem dúvidas de que isso é essencial para nossa sobrevivência? Todos nós necessitamos de um tempo adequado de descanso para a manutenção do corpo e consolidação da memória. Além disso, a boa qualidade do sono fortalece o sistema imunológico, previne doenças e estimula o bom funcionamento do cérebro.

Estudos mostram que nas últimas décadas estamos diminuindo consideravelmente o nosso tempo de sono, e isso se tornou um problema de saúde pública. A redução persistente da duração do sono pode levar ao aumento de risco de problemas crônicos, como doenças cardiovasculares e síndromes metabólicas.

Para ter ideia do seu impacto, veja dados que surpreendem:

  • Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), estima-se que 40% da população brasileira sofra com algum distúrbio do sono, em especial a insônia.
  • Dados da Associação Brasileira do Sono (ABS) apontam que cerca de 60% dos brasileiros dormem menos de 7 horas por dia, e 26% dos homens e 18% das mulheres economicamente ativos são trabalhadores que atuam em turnos com privação de sono.
  • O Detran estima que 20% dos acidentes de trânsitos estão associados a indivíduos que estão sonolentos.

Distúrbios do sono mais frequentes

  • Insônia É a condição mais conhecida, definida pela falta de sono, dificuldade para dormir, despertar simultâneo durante o sono ou ainda despertar muito cedo pela manhã após curto período de sono. Pode ser passageira, ligada ao estresse do dia a dia, ou crônica, ocasionada por disfunções orgânicas.
  • Fadiga e sonolência diurna Cansaço ocasionado pela privação do sono, leva à diminuição de reflexos.
  • Ronco De forma isolada pode não apresentar problemas, mas merece atenção, pois em um estágio avançado o fechamento da faringe (órgão do sistema respiratório e digestório) pode levar a complicações respiratórias, inclusive apneia (quando a pessoa não respira).
  • Distúrbios Respiratórios do Sono (DRS) São padrões de respiração anormais ou redução anormal da troca gasosa que ocorrem durante o sono. Alguns sinais que podem indicar o problema são  ronco, cansaço e sonolência diurna, dificuldade de concentração, entre outros. É um fator que aumenta o risco de doenças cardiovasculares e metabólicas, como infarto, hipertensão arterial, obesidade e resistência insulínica.

Quanto tempo devo dormir?

A maioria das pessoas já ouviu falar que o tempo ideal de sono é de 8 horas por dia, no entanto, a necessidade adequada do sono varia com a idade e, principalmente, com as necessidades individuais. Estima-se que para cada fase da vida há um tempo médio adequado de sono por dia, como mostra a tabela abaixo.

Entenda o que ocorre no seu corpo quando você não dorme

A privação do sono significa não dormir, já a restrição é a duração reduzida do sono. Uma das alterações fisiológicas mais comuns observadas após a privação do sono é a alteração no padrão de secreção hormonal que resulta em um estado catabólico. O hormônio do crescimento (fase 3), a testosterona (fase 4) e  a insulina são reduzidos, enquanto o cortisol é aumentado.

Uma noite de privação do sono é suficiente para a diminuição da glicose em importantes áreas do cérebro, responsáveis pela sensação de fome, o que se relaciona com aumento de apetite e peso corporal. A restrição do sono está ligada à fome, hormônios relacionados ao apetite, mudança de peso, mudanças na atividade cerebral, sensibilidade ou resistência à insulina e gasto energético.

Problemas relacionados a não dormir:

  • Diminui a função motora e do desempenho.
  • Diminui as funções cognitivas e memória.
  • Diminui a ação do sistema imunológico e da libido.
  • Aumenta a sensibilidade à dor e o risco de lesões.
  • Aumenta o estresse e irritabilidade.
  • Aumenta o apetite.
  • Aumenta os riscos de doenças cardíacas ou metabólicas.
  • Aumenta a sonolência no dia a dia e chances de acidentes.

Falta de sono, queda do desempenho e aumento de lesões

O sono inadequado pode reduzir o desempenho físico. Uma noite bem dormida garante a manutenção da saúde muscular, e sua privação ou restrição pode induzir a atrofia muscular. Estudos apontam que a privação ou restrição de sono prejudica a capacidade do músculo em gerar força muscular máxima em movimentos multiarticulares quando realizados sem intervenções específicas destinadas a aumentar a motivação.

Lembre-se que a saúde muscular é fortemente influenciada pela secreção hormonal. Por exemplo, se há a diminuição na secreção do hormônio do crescimento, prejudica-se as vias de síntese de proteínas; se há a diminuição da testosterona na fase 4 do sono, interfere-se no crescimento muscular; e se há o aumento do cortisol, estimula-se a principal via de degradação proteica. Todas essas alterações hormonais resultam em um ambiente altamente proteolítico (quebra das proteínas), caracterizado pela diminuição da síntese proteica e aumento da degradação.

Além disso, estudos comprovam que o sono é um fator de risco modificável para lesões esportivas. A privação ou restrição crônica de sono está associada a um maior risco de lesões em atletas que dormem menos de 8 horas por noite. Por isso, uma boa noite de sono é importante para não aumentar o  risco de lesões, além de favorecer a recuperação do corpo.

Dormi mal, o que fazer para combater os efeitos disso?

Estudos mostram que o exercício é benéfico para a prevenção e tratamento. Uma vez que o músculo e as respostas endócrinas geradas pelo exercício podem minimizar ou até mesmo anular os efeitos negativos da privação do sono no músculo. O exercício é considerado uma importante intervenção não farmacológica para a manutenção do volume muscular, outras estratégias que podem ajudar quem enfrenta o sono inadequado a realizar efetivamente o treinamento é o exercício em grupo ou treinar antes de períodos prolongados de vigília (acordado).

5 Dicas simples de como melhorar o sono

  1. Evite cochilos longos no final do dia.
  2. Levante-se na mesma hora todos os dias.
  3. Exponha-se à luz do sol durante o dia, o que ajuda a acertar o relógio biológico do seu corpo.
  4. Mantenha um ambiente propício do quarto para dormir, não assista à televisão, leia ou jogue jogos no seu smartphone ou tablet.
  5. Faça exercício físico regularmente.

O importante é que cada um conheça seu organismo e respeite as suas necessidades e limites. Quem trabalha no período da noite ou não possui uma rotina que favoreça ter um ritmo, deve ter atenção redobrada com a higiene do sono e buscar na atividade física e alimentação formas para melhorar a saúde. Em caso de sinal e sintoma de distúrbio do sono, busque ajuda especializada em medicina do sono para tratamento efetivo.

*Colaboração fisioterapeuta Doutora pela Unifesp Dra. Renata Luri e da fisioterapeuta pela Unifesp Dra. Bruna Barreto.

Referências:
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– The Slumbering Masses: Sleep, Medicine and Modern American Life
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Sobre a autora

Paola Machado é fisiologista do exercício, formada em educação física modalidade em saúde pela UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), mestre em ciências da saúde (foco em fisiologia do exercício e imunologia) e doutoranda em nutrição pela UNIFESP. É autora do Livro Kilorias - Faça do #projetoverão seu estilo de vida (Editora Benvirá). Atualmente, atua como pesquisadora, desenvolvendo trabalhos científicos sobre obesidade, e tem um canal de desafios (30 Dias com Paola Machado) onde testa a teoria na prática. Também é fundadora do aplicativo aplicativo 12 semanas. CREF: 080213-G | SP

Sobre a coluna

Aqui eu compartilharei conteúdo sobre exercício e alimentação para ajudar você a encontrar o caminho para um estilo de vida mais saudável. Os textos são cientificamente embasados e selecionados da melhor forma possível, sempre para auxiliar no seu bem-estar. Mas, lembre-se: a informação profissional é só o primeiro passo da sua nova jornada. O restante do percurso depende 100% de você e da sua motivação para alcançar seu objetivo.