Imagem corporal: você se enxerga de acordo com a realidade?
Paola Machado
30/03/2018 04h00
Crédito: iStock
É muito comum ouvir queixas a respeito do corpo. Esses dias postei uma foto sorrindo e reclamaram dos meus dentes debaixo, disseram que eram tortos. Percebi o minimalismo das pessoas. Meus dentes um pouco tortos me fazem mal? Prejudicam minha saúde? Será que preciso ser perfeita e simétrica? Outra vez questionaram por que minha barriga não é trincada, já que realizo tantos exercícios. Mas será que vale a pena abrir mão de tanta coisa por uma barriga tanquinho? É sua prioridade? Vai mudar sua vida uns gominhos a mais ou a menos? A minha não vai. Certamente, ter um abdome definido não me fará mais feliz. Se fizesse, correria atrás.
Percebo muita gente que reclama do corpo ou maximiza pequenas assimetrias, que não têm influência nenhuma sobre a saúde e, sim, sobre o estado mental e satisfação puramente estética. Diga para mim: quem não conhece alguma pessoa que vive querendo perder 2 kg ou que reclama sempre de celulites invisíveis, do quadril grande (que na realidade é normal), de culotes inexistentes ou de dobrinhas no braço? Enfim e afins… A insatisfação corporal pode tomar uma proporção que, às vezes, sai de controle e se torna uma patologia séria.
A imagem corporal é um mecanismo de identidade pessoal. É subjetivo, pois é uma construção multidimensional que temos de nós mesmos e depende muito da satisfação pessoal e de diversos aspectos emocionais.
É necessário ver se a forma que a pessoa se olha está dentro dos padrões normais ou passou do ponto. Em 2014, me lembro que assisti a uma reportagem sobre dismorfia corporal com a Tallulah Willis, filha do Bruce Willis e Demi Moore. Fiquei um pouco ressabiada com o vídeo. Em uma parte Tallulah afirma: "Sou diagnosticada com dismorfia corporal e a minha maior insegurança é com meu rosto e meu corpo. Foi quando o diagnóstico entrou em questão (…)." Já tinha estudado e discorrido sobre isco por diversas vezes, mas fiquei muito curiosa em destrinchar a patologia de forma mais profunda.
TRANSTORNO DISMÓRFICO CORPORAL OU DISTORÇÃO DE IMAGEM CORPORAL
O Transtorno Dismórfico Corporal é bem complexo de se diagnosticar, pois pode vir com sintomas de transtornos alimentares ou não. É um transtorno psiquiátrico. A pessoa que tem a condição sofre com imperfeições minímas ou até defeitos imaginários, o que interfere no seu dia a dia. Isso leva a pensamentos obsessivos e compulsivos associados aos pensamentos negativos e repetitivos.
Além do diagnóstico presencial por meio de conversas e questionários comparativos que devem ser analisados juntamente com o profissional para saber se o que a pessoa vê é compatível ao que os exames dizem, há alguns sinais que podemos observar.
1. Não conseguir falar de imperfeições com tranquilidade
A maioria das pessoas que sofre de dismorfia corporal não consegue falar abertamente sobre o assunto, por ter vergonha e/ou por aquele tema gerar um desconforto. Assim, elas costumam tratar da imperfeição, que só elas enxergam, como um tabu. Se a pessoa acha que a barriga está enorme e você diz que ela está bem, pode não adiantar, pois a pessoa já se conformou com a forma com a qual se enxerga.
2. Se escondem atrás das roupas
Realmente tem pessoas que são extremamente descoladas e gostam de estar antenadas na moda. Porém, não é essa questão que está em discussão. Para pessoas que sofrem de distorção de imagem corporal, é normal que todos os sinais e sintomas venham juntos com a forma que se vestem. Elas costumam se envergonhar do corpo e acabam evitando roupas que possam evidenciar o que ela acha uma imperfeição. Afinal, o que mais querem é desviar a atenção para o que as incomoda.
3. Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC)
Associado a dismorfia, é normal que o indivíduo desencadeie diversos outros transtornos, inclusive o Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC), que é uma compulsão incontrolável e repetitiva com efeito crônico e duradouro. Exemplo: pessoas que precisam deixar todos os objetos da casa alinhados ou precisam lavar a mão diversas vezes ao dia. Por esse motivo, realizar exercícios, fazer dietas e até cirurgias plásticas não costumam resolver a forma com que a pessoa se enxerga, pois o problema é psiquiátrico e deve ser tratado com profissionais capacitados.
4. Redução da vida social
Quando os problemas de dismorfismos começam a interferir na vida social, com certeza é um enorme sinal de alerta. A pessoa já não quer sair, se relacionar, trabalhar e os problemas corporais começam a tomar uma proporção que interfere totalmente na sua vida. Por esse motivo, é hora de buscar ajuda.
Dito isso, e não anulando a busca por tratamento, pontuarei algumas dicas que poderão melhorar a forma como se enxerga.
Tenha a real noção da beleza
Comece a observar as pessoas que são nomeadas como padrão de beleza, lindas, impecáveis e perfeitas em cliques do dia a dia. Eu não digo nas suas próprias mídias sociais, pois lá pode haver algum tipo de manipulação de fotos. Olhem as fotos marcadas, fotos feitas por fotógrafos em momentos descontraídos ou em vídeos sem edição –no Instagram Stories, por exemplo. Até as pessoas consideradas mais perfeitas têm imperfeições que passam despercebidas. Todos têm algum tipo de "defeito" e isso é natural. Afinal, é praticamente impossível atingir a perfeição e simetria.
Seja justo com a autocrítica
Você pode e deve ser crítico, mas tente ser positivo. Suas falas devem ser positivas. Comece a olhar partes do seu corpo que o fazem feliz. Enalteça essas qualidades em voz alta e, assim, acredite que você está fisicamente bem. Analise seu corpo e classifique, na sua cabeça, o que está ok, o que está ótimo e quais partes você pode melhorar. Faça um balanço e verá que sua imperfeição é mínima perto do que você tem de bom!
Respeite seu corpo
Seu corpo é seu templo, seu maior bem. Por isso, você deve respeitá-lo. Tenha um tempo para você, passeie, cuide-se, realize suas vontades, estipule metas atingíveis, foque na sua saúde. Em vez de ficar apontando os erros mínimos, busque uma vida melhor, faça exercícios, alimente-se direito. Tenha uma relação sincera com você mesmo, com seu eu e aprenda a equalizar seus pensamentos.
Seja seguro com sua aparência
Fique em pé, de cabeça erguida, postura reta e um sorriso no rosto. Você é importante para muita gente, especialmente para você mesmo, e tem o direito de ocupar o seu lugar no mundo. E lembre-se: o espelho é seu grande e mais sincero amigo. Permita-se olhar através do espelho, observe suas qualidades e elogie-se. Você escolhe seu caminho, com positividade.
Tome um choque de realidade
Acredito que essa seja a minha dica mais preciosa. Já fiz um post aqui sobre o número da balança, porém é necessário atentar-se a diversos pontos. Uma vez avaliei 30 modelos lindas. Todas magérrimas, altas, perfeitas. Fiz o cálculo de IMC –um número subjetivo que utilizamos para avaliar como está o índice de massa corporal — e todas estavam abaixo do considerado saudável (quase com anorexia). Apliquei um questionário de imagem corporal que se chama BSQ (Body Shape Questionnaire, disponível no International Journal of Eating Disorders) e comparei com o SMT (Silhouette Matching Task). Acreditem: elas sentiam-se com uma imagem que consideramos quase sobrepeso.
Por isso, de vez em quando é essencial darmos um choque de realidade no nosso corpo. Há formas muitas formas de fazer isso. Uma delas é o cálculo de IMC comparado ao SMT. Para saber seu IMC basta dividir seu peso (kg) por sua altura (m) ao quadrado.
Já no SMT as imagens variam da magreza (número 1) a obesidade (acima de 7) proposta por Stundard et al (1983).
Na imagem acima, escolha um número, relativo a como você se enxerga. Feito isso, observe seu IMC na tabela abaixo para analisar como está, de fato, agora.
É claro que o diagnóstico deve ser realizado com um profissional e com análises mais objetivas (incluindo questionários específicos, avaliações clínicas, antropométricas e de composição corporal). Aqui é uma forma de você ter acesso à informação e ligar um alerta para diversos assuntos. Faça escolhas saudáveis e analise se, de fato, você está se enxergando da forma como deveria.
REFERÊNCIAS:
– Loland, N.W. The aging body: attitudes toward bodily appearance among physically active and inactive women and men of different ages. Journal of Aging and Physical Activity 2000;8:197-213.
– Stunkard, A.J.; Sorenson, T.; Schlusinger, F. Use of the Danish Adoption Register for the study of obesity and thinness. In: Kety SS, Rowland LP, Sidman RL, Matthysse SW, editors. The genetics of neurological and psychiatric disorders. New York: Raven, 1983;115-20.
– Damasceno, V.O.; et al. Tipo físico ideal e satisfação com a imagem corporal de praticantes de caminhada. Rev Bras Med Esporte, vol. 11, nº3. 2005.
– Mantovani, B.M.; et al. Nível de satisfação com a imagem corporal de universitários. Revista Digital. Buenos Aires. Ano 14. nº 132. 2009.
Sobre a autora
Paola Machado é fisiologista do exercício, formada em educação física modalidade em saúde pela UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), mestre em ciências da saúde (foco em fisiologia do exercício e imunologia) e doutoranda em nutrição pela UNIFESP. É autora do Livro Kilorias - Faça do #projetoverão seu estilo de vida (Editora Benvirá). Atualmente, atua como pesquisadora, desenvolvendo trabalhos científicos sobre obesidade, e tem um canal de desafios (30 Dias com Paola Machado) onde testa a teoria na prática. Também é fundadora do aplicativo aplicativo 12 semanas. CREF: 080213-G | SP
Sobre a coluna
Aqui eu compartilharei conteúdo sobre exercício e alimentação para ajudar você a encontrar o caminho para um estilo de vida mais saudável. Os textos são cientificamente embasados e selecionados da melhor forma possível, sempre para auxiliar no seu bem-estar. Mas, lembre-se: a informação profissional é só o primeiro passo da sua nova jornada. O restante do percurso depende 100% de você e da sua motivação para alcançar seu objetivo.